
Você já me ouviu dizer que migrar é um ato de coragem. Afinal, você não pega só um avião e muda de endereço, mas atravessa fronteiras geográficas, culturais, emocionais e simbólicas. E embora essa travessia seja muitas vezes motivada por sonhos, oportunidades ou necessidades, ela quase sempre coloca você diante de uma pergunta silenciosa e poderosa: Quem sou eu, agora, neste novo país?
É aqui que sua autoestima se torna um eixo central na sua experiência migratória.
Ao contrário do que muitos pensam, a autoestima não é apenas “gostar de si mesma” ou “ter pensamentos positivos sobre quem você é”. Na psicologia, compreendemos a autoestima como o valor que atribuímos a nós mesmas a partir da percepção de quem somos, do que merecemos e do quanto sentimos que pertencemos (não apenas no plano individual, mas também no social e no simbólico).
Para mulheres imigrantes, como eu e você, essa construção da autoestima se torna ainda mais complexa. Isso porque o processo migratório desestabiliza estruturas identitárias, desloca papéis sociais e exige a reinvenção constante de si mesma em um novo território, muitas vezes sem os apoios emocionais, culturais e familiares que sustentavam nossa autoestima no país de origem.
O que a migração faz com a sua autoestima?
Os estudos na área da psicologia intercultural, como os de Berry (1997) e Achotegui (2002), demonstram que migrar pode provocar um impacto significativo na sua percepção de valor pessoal. Afinal, muitos dos elementos que antes reforçavam a sua autoestima — profissão reconhecida, rede de amizades, domínio da língua, senso de pertencimento — são, em alguma medida, perdidos ou transformados durante a imigração.
Além disso, o racismo, a xenofobia e a invisibilização social que muitas imigrantes brasileiras enfrentam na Europa geram uma constante sensação de inadequação. Como psicóloga, eu escuto com frequência relatos como:
“Eu me sinto menos inteligente aqui porque não consigo me expressar como antes.”
“No Brasil eu era alguém, aqui pareço invisível.”
“Parece que nunca estou à altura.”
Esses sentimentos, embora compreensíveis, corroem lentamente a autoestima, especialmente quando não são elaborados com o devido cuidado.

Por que fortalecer a sua autoestima é urgente?
A autoestima funciona como um alicerce emocional. É ela que sustenta a sua capacidade de tomar decisões com segurança, de estabelecer limites, de construir vínculos saudáveis e de lidar com os desafios diários com mais resiliência. Quando você fortalece sua autoestima como uma mulher imigrante, passa a se relacionar com a experiência migratória de forma menos reativa e mais consciente.
E então você começa a não se anular para ser aceita, a não depender da aprovação externa para se sentir válida, e, o mais importante, a não se abandonar no processo de adaptação.
Ter autoestima significa manter viva a sua história — mesmo que o mundo ao redor ainda não a reconheça por completo. É sustentar internamente o valor de ser quem você é, mesmo diante do desconhecido.
Como cuidar da sua autoestima vivendo fora?
O fortalecimento da sua autoestima não acontece por mágica, e tampouco depende apenas de frases motivacionais. É um trabalho interno que te exige consciência, cuidado e, muitas vezes, apoio psicológico especializado. Abaixo, compartilho alguns pontos essenciais:
- Reconhecer os impactos da imigração na sua identidade: Validar o que está difícil é o primeiro passo para cuidar de si.
- Revisar suas referências de valor: Será que você está medindo sua autoestima por padrões que já não fazem sentido na sua vida atual?
- Construir vínculos com quem te vê de verdade: Relações que acolhem e não julgam são fundamentais para reerguer a autoestima.
- Cultivar narrativas internas mais compassivas: A forma como você fala consigo mesma importa, principalmente em momentos de fragilidade.
- Buscar espaços seguros de escuta e reconstrução: A psicoterapia pode ser um desses espaços. Um lugar onde você não precisa estar pronta, apenas disposta a se reencontrar.
A autoestima é um direito
Por fim, é preciso afirmar algo que talvez você nunca tenha ouvido com clareza: ter autoestima é um direito seu e não um luxo, nem um capricho. É o que te permite sustentar a sua dignidade mesmo em um país que ainda não entende sua trajetória. É o que te dá força para construir uma vida com sentido, mesmo longe das raízes. E, sobretudo, é o que te lembra, todos os dias, que você merece ocupar o seu lugar no mundo — com voz, com presença e com verdade.